Venezuelanos representam 75% das novas contratações 

Com apoio de empresas e da comunidade, imigrantes encontram espaço para construir raízes no estado 

Gustavo José Benevenutti 

Santa Catarina se tornou, nos últimos anos, um dos principais destinos de venezuelanos que buscam recomeçar a vida fora de seu país. O estado lidera o ranking nacional de contratações de trabalhadores estrangeiros e, entre eles, os venezuelanos representam a maioria. Segundo dados recentes do Ministério do Trabalho, cerca de 75% das admissões são de pessoas originárias da Venezuela. A presença desse grupo já é visível em diversos setores da economia catarinense, com destaque para turismo, indústria e serviços. 

O movimento migratório tem como pano de fundo a crise social e econômica enfrentada pelo país. A instabilidade política, a inflação e as dificuldades de acesso a itens básicos levaram milhares de pessoas a deixar o país em busca de melhores condições de vida. Muitos encontraram não apenas emprego, mas também acolhimento e a possibilidade de construir novas trajetórias. 

Apesar da receptividade, os primeiros passos em território catarinense não costumam ser simples. A barreira do idioma é, na maioria dos casos, a dificuldade mais citada pelos recém-chegados. Além da língua, há desafios como o alto custo de moradia e a adaptação a uma nova cultura.  

“O idioma e a qualificação profissional estão entre as principais dificuldades enfrentadas pelos imigrantes na hora de buscar uma vaga de emprego”, confirma Eduardo Baer, assessor de Trabalho e Renda do Sine de Gaspar. 

Para ajudar a minimizar essas barreiras, já houve iniciativas em parceria com o Instituto Federal de Santa Catarina (Ifsc), que oferece aulas de português para estrangeiros. 

Da adaptação à permanência 

A história de Erick Alexandre Martínez Rodrigues, 49 anos, é um exemplo dessa jornada. Natural de Barquisimeto, cidade venezuelana localizada na região central do país, ele chegou a Gaspar em 2021, após viver por alguns anos em países vizinhos da América do Sul.  

A vinda para o Vale do Itajaí foi motivada pelo relato de um amigo que já morava na região. Pouco tempo depois de enviar o currículo, conseguiu trabalho em um hotel da cidade. 

“Fui o primeiro venezuelano a trabalhar no local. Depois, outros colegas começaram a chegar. Agora já somos muitos”, aponta. A oportunidade também possibilitou que ele trouxesse a esposa e os três filhos, que hoje estudam e trabalham em Gaspar.  

O acolhimento da comunidade local foi determinante no processo de adaptação. “O povo daqui é muito receptivo. Gosto da cultura, das pessoas. No começo foi difícil pelo idioma, eu não falava nada de português, mas sempre havia alguém disposto a ajudar”, conta. 

Histórias como a de Erick se repetem em toda a região. Segundo entidades empresariais, a participação dos imigrantes na mão de obra tem sido decisiva para suprir a falta de trabalhadores em algumas áreas. A Federação das Associações Empresariais de Santa Catarina (Facisc) destaca que os imigrantes têm papel fundamental para manter setores da economia em funcionamento. 

Além disso, algumas empresas têm buscado formas de apoiar a integração. Alojamentos a preços acessíveis, cursos de português básico e a valorização da experiência dos venezuelanos no atendimento a turistas são exemplos de medidas que vêm sendo aplicadas.  

Miriam Pacheco, responsável pelo setor de Recursos Humanos do Fazzenda Park Resort, explica que esse tipo de iniciativa ajuda não apenas os trabalhadores, mas também o desenvolvimento das empresas. “Oferecer condições de moradia e programas de comunicação em português garante mais segurança e estabilidade para os colaboradores estrangeiros. Isso favorece a adaptação e contribui para que eles permaneçam mais tempo, fortalecendo o vínculo com a equipe e a qualidade do serviço prestado”, afirma. 

A presença venezuelana não se restringe ao ambiente de trabalho. Aos poucos, elementos da cultura do país vizinho começam a se integrar ao cotidiano catarinense. Em várias cidades já é possível encontrar produtos típicos em mercados e lojas especializadas.  

Para os imigrantes, manter tradições como a culinária é uma forma de preservar a identidade e, ao mesmo tempo, compartilhar com a comunidade local um pouco de sua origem. 

No caso de Erick, essa convivência entre culturas se tornou parte da rotina. Ele conta que hoje consegue preparar pratos típicos com mais facilidade, já que encontra os ingredientes em estabelecimentos da região ou mesmo em compras feitas pela internet. “No começo era difícil, mas agora já tem de tudo. Também porque tem muita gente da Venezuela morando aqui”, diz. 

Se os primeiros passos foram marcados por dificuldades, a perspectiva atual é de permanência e esperança. Erick afirma que recomendaria a vinda de amigos e familiares para o estado. 

Crescimento 

De acordo com o Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra), o número de venezuelanos com registro ativo no Brasil passou de cerca de 46 mil, em 2018, para mais de 500 mil, em 2024. Em Santa Catarina, o grupo já ultrapassa 25 mil pessoas. 

O avanço desses números reforça que a imigração vinda da Venezuela deixou de ser temporária, e atualmente representa uma nova etapa de vida, marcada pela busca de estabilidade, trabalho e pertencimento. 

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