Entre a lei e a vida: a luta entre a legalização e a proibição do Aborto no Brasil

Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que três em cada quatro abortos foram feitos de forma insegura na América Latina

O aborto é um dos assuntos mais polêmicos em debates sobre ética, direitos reprodutivos e a própria noção de vida. A discussão atravessa limites geográficos, culturais e religiosos, abordando questões fundamentais sobre a autonomia da mulher, a proteção da vida fetal e o papel do Estado na regulação da reprodução.

O procedimento pode ser classificado em três tipos:

Espontâneo: ocorre naturalmente devido a fatores como idade, anomalias cromossômicas ou problemas de saúde da gestante;

Acidental: resulta de eventos traumáticos externos, como quedas, acidentes ou sustos;

Induzido: é realizado de forma deliberada, seja por escolha da gestante, abuso sexual, riscos à saúde materna ou anomalias fetais incompatíveis com a vida.

Diferentes perspectivas

Um dos pontos centrais no debate é a questão da autonomia da mulher sobre seu próprio corpo. Defensores do direito ao aborto argumentam que as mulheres devem ter a liberdade sobre seu corpo, incluindo a decisão de interromper uma gravidez indesejada. Eles alegam que proibir o procedimento legalizado pode levar a consequências prejudiciais, como abortos clandestinos, colocando em risco a vida das mulheres.

Elaine de Moura, de 35 anos e mãe de uma menina, é a favor da legalização. Para ela, “ninguém tem direito sobre o corpo da mulher, a não ser ela mesma”. Elaine reflete ainda sobre a responsabilidade de ter uma criança: “na maioria dos casos é a mãe que fica responsável e o pai vira um pagador de pensão, então eu fico muito chateada quando um homem vem opinar sobre esse assunto, porque não diz respeito ao corpo dele”. 

A estabilidade emocional e financeira também são pontos destacados por Elaine, para quem, “é mais fácil para uma mulher branca, em um relacionamento estável e em boas condições financeiras manter um bebê”.  

Por outro lado, opositores ao aborto frequentemente defendem o direito à vida do feto, argumentando que a ela começa na concepção e, portanto, interromper uma gravidez é equivalente a tirar uma vida humana. 

Muitos desses argumentos têm raízes em crenças religiosas e culturais. Além disso, alguns defendem que a disponibilidade do aborto pode ser usada como uma solução conveniente para problemas sociais e econômicos, ao invés de abordar as verdadeiras causas desses problemas.

Dalvana Senen Erbano, de 31 anos, sem filhos, se posiciona contrária ao aborto em praticamente todos os casos, com exceção daqueles que envolvem estupro. Porém, ela ressalta que, mesmo nessas situações, seu apoio ao procedimento se limita às primeiras semanas de gestação. Quando questionada sobre os motivos que sustentam sua opinião, ela enfatiza a importância que atribui à vida.

E no resto do mundo?

Em muitos países, as leis que regulam o aborto variam. Alguns permitem o aborto sob uma ampla gama de circunstâncias, enquanto outros têm leis mais restritivas que limitam severamente o acesso.

A questão também tem sido objeto de lutas políticas e movimentos sociais, com grupos de defesa dos direitos das mulheres pedindo o acesso seguro e legal ao procedimento, enquanto grupos pró-vida trabalham para restringir ou proibi-lo.

Nesse contexto, a Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que três em cada quatro abortos foram feitos de forma insegura na América Latina. São mais de 150 mil mulheres por ano que sofrem riscos com cirurgias perigosas e milhares que morrem por causa delas.

Descriminalizar ou Legalizar?

É importante destacar a diferença entre a descriminalização, que implica em deixar de considerar a prática como um crime, e a legalização,  que envolve a regulamentação completa do aborto, incluindo a estipulação de limites com base nas semanas de gestação. Além disso, essa perspectiva interfere na criação de uma legislação que obriga os planos de saúde a atenderem solicitações de aborto.

Países da América Latina onde é ou não é legalizado o aborto. Crédito: Poder360

Aborto no Brasil

No contexto brasileiro, o Código Penal de 1940 estabelece que o aborto é crime, com exceção em casos de gravidez resultante de estupro ou quando a gestação coloca em risco a vida da mulher. As penalidades para o aborto variam de acordo com o envolvimento da gestante e outras circunstâncias, sendo julgados pelo tribunal do Júri.

De acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2021, foram registrados 411 novos processos relacionados ao crime de aborto praticado pela gestante ou com seu consentimento. No entanto, o número real de casos pode ser maior, pois o CNJ depende do envio de informações pelos tribunais estaduais.

O procedimento envolve questões éticas, legais e de saúde pública. É de extrema importância abordar esse tema com diálogo respeitoso e consideração pelas diversas perspectivas. Diálogos construtivos são fundamentais para encontrar soluções que equilibrem os direitos das mulheres e as preocupações relacionadas à vida do feto. 

Por Bruna Friedel, Caçane Maloz e Guilherme Peters

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