Onde a coragem e a empatia se encontram

O relato de um bombeiro voluntário e a sua contribuição para a comunidade

Você arriscaria a vida por alguém sem receber nada em troca?

Ouça a reportagem completa
Gravação por Bruna Friedel.

A chuva fina caia e criava sombras no rio enquanto o cheiro de terra molhada subia para o ar. Sentado em uma mesa de plástico em um deque de madeira na parte de fora do Clube de Canoagem Kentucky, em Jaraguá do Sul (SC), Renato da Silva Fonseca Fritsche conta como é dedicar 13 anos da própria vida para proteger outras pessoas. 

O bombeiro voluntário de 34 anos é especializado em resgates aquáticos e carrega consigo uma paixão por aventura. Sempre esteve cercado por influências positivas, primos e amigos que faziam parte do grupo de bombeiros. Escutar as histórias de ocorrências e ver o que aqueles que se dedicam a salvar os outros são capazes de fazer, provocou em Renato a vontade de continuar com a missão de ajudar a comunidade. E é exatamente isso que faz até hoje, sem pretensão de parar: “eu não meço ocorrência, não tenho tempo ruim. Eu me doou para aquilo, sabe? Para mim é como estar em casa, minha segunda casa. Eu sou apaixonado pelo que faço”.

Equipe de bombeiros voluntários com equipamentos de resgates aquáticos. Renato é o segundo bombeiro agachado da esquerda para a direita/Foto: Arquivo pessoal

Em Jaraguá do Sul, o trabalho dos bombeiros voluntários se faz presente em todo tipo de ocorrência, desde resgates básicos e pequenos acidentes até incêndios e trabalhos com enchentes. Em 2014, Renato e um grupo de voluntários estavam monitorando o Rio Itapocu, principal rio da cidade, em época de grandes chuvas. A possibilidade de uma cheia atingir a cidade era grande. Eles monitoravam o rio para garantir que todos os habitantes fossem avisados e preparados para o que poderia acontecer. “Foram dias sem dormir, monitorando o rio e trabalhando com os bombeiros. Quando eu finalmente cheguei em casa, me chamaram para resgatar uma mulher grávida no bairro Rio da Luz. A partir daí, fiquei mais dois dias em função de atender as ocorrências”, recorda.

O que começou em uma quinta-feira, se estendeu até o domingo, quando a água chegou às ruas da cidade. Renato foi chamado para resgates em diversos bairros, como o Amizade e Rio da Luz. Escute o relato completo do bombeiro voluntário sobre uma das enchentes que marcou Jaraguá do Sul.  

Relato de Renato da Silva Fonseca Fritsche, bombeiro voluntário.

Com anos de voluntariado, Renato acumula centenas de ocorrências, mas uma que ficou marcada na memória do bombeiro não foi uma morte ou um prédio em chamas, mas sim participar de uma busca.

Uma mulher desapareceu perto do rio e Renato foi convocado para fazer parte da equipe de busca. Ele instruiu a todos que marcassem qualquer vestígio visto, que poderia ser até uma pista de onde ela estava. Com ajuda de um cão farejador, Renato e outros bombeiros encontraram um sapato e entregaram o acessório para o marido da vítima, que reconheceu o objeto pessoal da esposa. O bombeiro, então, sugeriu ao comando que buscassem pelo corpo na área que encontraram o sapato, mas foi negado. Depois de um dia, outros bombeiros foram procurar na mesma área e encontraram o corpo sem vida da mulher. “Depois eu fui lá no IML ver ela morta para ter certeza que realmente ela estava sem o sapato, e ela estava. Esse caso me chamou atenção por não darem atenção aquela pista que tínhamos encontrado”. 

Bombeiro voluntário entre armário com vestimentas e um bote. Crédito: Bruna Marques Friedel.

Para Renato, entregar um corpo à família é tão importante quanto salvar uma vítima. Leva tranquilidade e um fechamento para a angústia dos familiares, para então passarem pelo luto em paz. 

Essa conclusão de casos o faz refletir sobre o apoio psicológico que os bombeiros recebem. Mesmo com o curso de preparação, o bombeiro mais experiente sofre as consequências do trabalho. 

Bombeiro voluntário entrando em caminhão. Crédito: Bruna Marques Friedel.

Atualmente, os bombeiros voluntários de Jaraguá do Sul têm acesso a atendimento psicológico dentro do batalhão, essa ação está implementada há apenas três anos na corporativa, porém não é diretamente focada na saúde mental dos voluntários: “hoje, se tem treinamento para atender ocorrências psicológicas e se temos alguma crise, os psicólogos dos bombeiros atendem a gente”. Mesmo preparados para lidar com situações difíceis, a empatia e a humanidade são requisitos para fazer um bom trabalho. Manter a mente preparada para atender vítimas desesperadas e ocorrências perigosas é algo importante para o bombeiro e afeta diretamente as ações do profissional.

Mesmo com a exaustão do trabalho, Renato não se vê parado em casa nas horas vagas. Com emprego fixo na Defesa Civil da cidade, dedicar os momentos que estaria de folga em plantões no quartel de bombeiros é uma honra para ele. O tempo dedicado a contribuir para melhorar a qualidade de vida da comunidade é como uma missão de vida. 

Caminhão oficial dos Bombeiros Voluntários de Jaraguá do Sul. Crédito: Bruna Marques Friedel.

Além disso, a vida no quartel de bombeiros é agitada, a amizade criada por todos os voluntários que o local comporta é mágica e todos se divertem ao estar lá. O senso de comunidade é presente e mostra como a felicidade de quem faz o bem ao próximo, também é fruto do ambiente em que ele está. 

Com muito respeito e admiração pelos colegas, Renato é um exemplo de cidadão comum que se dedica para oferecer um lugar melhor aqueles que vivem ali. O bombeiro e a comunidade precisam ser uma só, o voluntário faz parte da cidade e a população pode fazer parte do voluntariado, basta carregar consigo empatia, coragem e muita vontade de aprender. 

Uniformes especiais para combate contra fogo. Crédito: Bruna Marques Friedel.

Por: Bruna Marques Friedel

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