Como as novas dinâmicas de trabalho estão transformando a rotina profissional, vantagens, desvantagens e principais desafios de cada modelo
Gravação por Gabriel Cestari.
As diferentes formas de trabalho aparecem cada vez mais em nosso cotidiano, e muitos ainda estranham os modelos home office e híbrido, mas essas modalidades estão se tornando cada vez mais presentes em nossas vidas. Nos últimos anos, o mercado de trabalho passou por transformações profundas, aceleradas pela pandemia da Covid-19. Antes da crise sanitária global, o trabalho presencial era norma em empresas de diversos setores. No entanto, as medidas de distanciamento social e os avanços tecnológicos, como o uso de plataformas de videoconferência e sistemas de gestão online, permitiram uma rápida transição para o home office, um modelo que, até então, era considerado por muitos como exceção, limitado a poucos profissionais e setores. Com a retomada das atividades presenciais, empresas ao redor do mundo estão experimentando o modelo híbrido, que combina o melhor dos dois mundos: o presencial e o remoto, permitindo maior flexibilidade para funcionários e empregadores, sem abrir mão da colaboração física.
O presencial é o modelo tradicional, onde os colaboradores trabalham no local físico da empresa. As vantagens incluem maior interação social e acesso a uma infraestrutura profissional.“A facilidade de comunicação, acredito que seja o ponto mais positivo do formato presencial, pois você consegue tirar dúvidas rapidamente e ter uma socialização maior no ambiente de trabalho”, destaca Leonardo Laureth, assistente administrativo na empresa Vale Auto Pintura. No entanto, esse modelo oferece menos flexibilidade e exige tempo e recursos para o deslocamento diário.

O home office, por sua vez, permite que os colaboradores trabalhem diretamente de casa. Entre as maiores vantagens estão a flexibilidade de horários, a economia de tempo e dinheiro com deslocamentos, além de um equilíbrio maior entre a vida pessoal e profissional. Contudo, ele traz alguns desafios, como o isolamento social, a necessidade de manter a disciplina e a dependência de uma boa infraestrutura tecnológica.
Por fim, o modelo híbrido mistura o melhor do presencial e do home office, dando flexibilidade para que os colaboradores alternem entre dias no escritório e em casa. Esse formato se ajusta bem às preferências individuais e é considerado um equilíbrio entre os benefícios dos dois modelos. Porém, também traz desafios, como a necessidade de uma boa coordenação e o cuidado para manter uma cultura organizacional forte, especialmente quando as equipes estão espalhadas.

Essas novas práticas de trabalho estão impactando de maneira significativa não apenas as políticas corporativas, mas também a dinâmica de equipes, a gestão de recursos humanos, a cultura empresarial e até as questões legais, como a regulação do teletrabalho e os direitos dos trabalhadores nesse contexto. O futuro do emprego, moldado por essas transformações, levanta desafios sobre produtividade, bem-estar dos funcionários e a sustentabilidade das companhias em um mundo que exige cada vez mais flexibilidade e adaptação. “Os principais desafios são as questões relacionadas aos resultados, relacionamento e cultura”, aponta Luciano Trentin, docente e gerente de gestão humana. Segundo ele, “não podemos tratar as pessoas da mesma forma e achar que todas terão o mesmo comportamento. Algumas pessoas não conseguem trabalhar com autonomia total e gerar resultados, e tanto as empresas quanto os colaboradores perdem com a falta de relacionamento face a face, o que impacta diretamente no comportamento, na redução da criatividade, na qualidade de vida, na troca de conhecimento e na consistência e engajamento com a cultura organizacional”, conclui.
Qual a eficiência de cada modalidade?
A produtividade é um dos principais pontos que as empresas consideram ao decidir o formato de trabalho ideal. No modelo presencial, a supervisão direta e a comunicação mais rápida são vistas como vantagens, permitindo um acompanhamento mais próximo, além da facilidade para resolver questões de forma imediata. Essa proximidade física também pode gerar uma maior integração entre as equipes e facilitar a troca de ideias espontâneas, o que, em alguns casos, contribui para soluções mais rápidas e criativas.
Em contrapartida, o home office provou que, com as ferramentas adequadas, os funcionários podem ser tão ou até mais produtivos. Plataformas de videoconferência, chats corporativos e softwares de gestão de tarefas tornaram possível manter o fluxo de trabalho eficiente mesmo à distância. Além disso, a ausência de deslocamentos e a flexibilidade de horários permitiram a muitos trabalhadores encontrar um ritmo de trabalho mais equilibrado e produtivo.

Um dos pontos positivos que algumas empresas vêm adotando no home office é a ginástica laboral, fundamental para este formato, já que os colaboradores passam grande parte do dia sentados na frente do computador. Praticar atividades físicas durante o expediente traz benefícios como a melhoria da postura, redução de dores musculares e um bem-estar geral. Para as empresas, essa prática pode ajudar a reduzir o número de acidentes de trabalho relacionados à ergonomia e aumentar a satisfação e o engajamento dos funcionários, resultando em ganhos de produtividade.
Já no modelo híbrido, a produtividade pode variar dependendo de como a rotina é organizada. Alternar entre o trabalho em casa e no escritório pode trazer um equilíbrio interessante: momentos presenciais são usados para atividades que demandam mais colaboração e interatividade, como reuniões, brainstorming e tomadas de decisão conjuntas. Por outro lado, o home office é ideal para tarefas que exigem mais foco e concentração, permitindo ao trabalhador realizar atividades de forma mais tranquila, sem as interrupções comuns do ambiente corporativo. A chave do sucesso neste modelo está em uma boa gestão do tempo e no planejamento eficiente das atividades, de modo que se aproveite o melhor dos dois formatos.
Impactos no bem-estar psicológico dos trabalhadores
A saúde mental dos trabalhadores se tornou um ponto importante no debate sobre os novos formatos de trabalho. Durante a pandemia, o home office destacou desafios como a solidão e a dificuldade em separar o trabalho da vida pessoal. No entanto, também trouxe benefícios, como menos estresse com deslocamentos e horários mais flexíveis.
O trabalho presencial proporciona um ambiente mais favorável à socialização e ao apoio emocional entre colegas, aspectos cruciais para o bem-estar psicológico. Por outro lado, o modelo híbrido surge como uma tentativa de equilibrar essas interações com a flexibilidade do home office, combinando o que há de melhor em ambos os formatos. Para muitos profissionais, essa flexibilidade tem contribuído significativamente para uma melhor qualidade de vida e saúde mental.
“O principal benefício que percebo é a melhoria na saúde mental. No ambiente corporativo, a pressão constante para produzir pode ser desgastante e, em alguns casos, levar ao burnout. O home office, por outro lado, oferece um ambiente mais confortável e a possibilidade de pausas mais frequentes, o que contribui para uma melhor qualidade de vida”.
Amanda Dittrich, auxiliar de redação publicitária que atua no formato híbrido em uma agência de publicidade.
A Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional, citada por Amanda, é um transtorno emocional causado por exaustão extrema, estresse e esgotamento físico, decorrente de situações de trabalho desgastantes, que exigem alta competitividade ou grande responsabilidade. A principal causa desse problema é o excesso de trabalho. A síndrome é comum em profissionais que enfrentam pressão diária e responsabilidades constantes, como médicos, enfermeiros, professores, policiais, jornalistas, entre outros.
As empresas podem buscar formas de evitar este problema de saúde como novas normas internas de conduta, implementação de fluxos de trabalho, flexibilização da jornada, e estabelecimento de metas alinhadas com a realidade da organização. São formas de dar leveza ao trabalho e fazer com que o funcionário se sinta valorizado e tenha mais tranquilidade e disposição para executar suas tarefas.
A dinâmica e interação entre colaboradores
A cultura organizacional é peça-chave para o sucesso de qualquer empresa, e os novos formatos de trabalho estão desafiando as interações tradicionais. Presencialmente, ela se constrói naturalmente no convívio diário, nas conversas informais e no espaço compartilhado. Essas interações precisam ser adaptadas quando falamos de home office, pois muitas vezes são mediadas por tecnologias digitais, o que pode enfraquecer o senso de pertencimento e a colaboração.

O modelo híbrido surge como uma oportunidade de reinventar essa cultura, combinando encontros presenciais estratégicos com a flexibilidade do trabalho remoto. Para que essa fórmula funcione, empresas têm investido em uma comunicação eficaz e em práticas que reforcem a conexão entre os colaboradores, independentemente de onde trabalhem.
Infraestrutura e Custos: Impactos financeiros para empresas e trabalhadores
Escolher um modelo de trabalho também tem implicações financeiras tanto para as empresas como para os trabalhadores. O presencial, por exemplo, costuma exigir um investimento maior em infraestrutura física, como escritórios, máquinas e equipamentos.
O trabalho remoto, apesar de oferecer flexibilidade, impõe novos desafios, especialmente financeiros, aos trabalhadores, que precisam transformar suas casas em ambientes de trabalho funcionais. Para muitos profissionais, essa adaptação envolve custos significativos com equipamentos e móveis adequados, criando uma realidade que pode ser desafiadora. A professora de história da rede estadual de Santa Catarina, Marilu Antunes, descreve essa realidade: “Em alguns aspectos, recebemos apoio, sim, como a plataforma fornecida pelo Estado e as conferências e palestras para instrução de seu uso ou de aplicativos. Porém, todo o restante foi investimento pessoal: computador, celular, uma cadeira adequada, uma mesa adequada”, explica.
A fala de Marilu evidencia que, sem a estrutura necessária, a produtividade é afetada, e o peso financeiro dessas adaptações recai sobre o trabalhador, que muitas vezes precisa arcar com esses custos do próprio bolso. Além do investimento em móveis e equipamentos, muitos profissionais também precisam considerar a melhoria da infraestrutura tecnológica em suas casas, como a contratação de serviços de internet mais rápidos e confiáveis. Essa realidade levanta questões importantes sobre a responsabilidade das empresas em apoiar seus funcionários nessa transição, oferecendo, por exemplo, auxílios financeiros ou equipamentos que garantam um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo. A ausência desse suporte pode não apenas comprometer a eficiência dos colaboradores, mas também gerar um desgaste emocional e financeiro que impacta o equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
Entretanto, existem sim empresas que fornecem os equipamentos a seus colaboradores. Um exemplo é a Kinghost, empresa brasileira de soluções digitais para profissionais de tecnologia e pessoas empreendedoras. A organização disponibiliza equipamentos de trabalho (notebook e acessórios), além de um link de internet ou o pagamento de ajuda de custo no valor de R$150,00 por mês para eventuais despesas.
O modelo híbrido é como um meio-termo inteligente: as empresas conseguem diminuir o tamanho dos seus escritórios e economizar, enquanto os funcionários ganham liberdade. Mas essa mudança não é só sobre ajustar o espaço físico. Também é preciso investir em tecnologia para garantir que todos possam colaborar e se comunicar com eficiência.
Legislação: O desafio de regular as novas modalidades de trabalho
À medida que as formas de trabalho evoluem, as leis trabalhistas também precisam se adaptar para proteger os direitos dos trabalhadores, não importa onde eles estejam. Antes da pandemia, as leis trabalhistas em muitos países, incluindo o Brasil, estavam totalmente voltadas para o trabalho presencial, com regras bem definidas sobre jornadas, intervalos e condições de segurança no trabalho.
No Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) já previa o teletrabalho, mas foi com a pandemia da Covid-19 que a necessidade de ajustes se tornou mais evidente. “Atualmente, a CLT prevê modalidades de trabalho presencial e de teletrabalho, cada uma com suas especificidades, o que evidencia uma lacuna legislativa em relação aos modelos mais contemporâneos e utilizados no Brasil”, destaca João Valença, advogado trabalhista do VLV Advogados. Segundo ele, “a discussão sobre leis específicas para a modalidade híbrida deve ser promovida no país, uma vez que essa forma de trabalho está se tornando cada vez mais comum nas empresas brasileiras. Os benefícios dessa modalidade são evidentes, como o aumento da qualidade de vida, conforto e maior contato com a família, justificando a necessidade de um debate mais aprofundado”, explica.

Durante a crise, a Medida Provisória 927 trouxe algumas mudanças temporárias e flexibilizações para o home office, mas essas medidas eram limitadas e temporárias. Agora, é fundamental que as leis evoluam para refletir a nova realidade do trabalho remoto e híbrido.
Países como a França e a Bélgica já implementaram políticas para garantir que os trabalhadores não sejam forçados a responder e-mails ou mensagens fora do horário de expediente. No Brasil, no entanto, ainda não há legislação específica que assegure esse direito à desconexão. João Valença, aponta que, “apesar da vantagem de ter o trabalho acessível, há a desvantagem de estar sempre conectado, dificultando ao empregado o desligamento e o efetivo usufruto de seu descanso”. Embora não exista uma lei específica, ele ressalta que “há uma vasta jurisprudência que reconhece e ampara o trabalhador que se sente prejudicado, com decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST) assegurando o direito ao descanso e considerando a subtração desses momentos pelo empregador como dano existencial”, relata.
O modelo híbrido também apresenta desafios extras, como a necessidade de equilibrar a flexibilidade entre os dias no escritório e os dias remotos. É essencial que as empresas assegurem que os trabalhadores não sejam prejudicados por optar pelo trabalho remoto e que todos tenham acesso igual às oportunidades de crescimento e desenvolvimento, independentemente de onde estejam trabalhando.
Panorama em Santa Catarina e no Brasil
Uma pesquisa realizada em 2023 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), registrou que quase 14% dos catarinenses formalmente ocupados estavam em home office no ano de 2022. Foram cerca de 378 mil catarinenses que trabalharam nesse modelo, o que corresponde a 9,7% dos trabalhadores formalmente ocupados no estado. Santa Catarina ficou em oitavo lugar no ranking de estados com maior percentual de trabalhadores em trabalho remoto.

Um estudo realizado pela consultoria JJL, que entrevistou 289 gerentes de RH e financeiros em 13 países da América Latina, ilustra bem essa mudança para modelos de trabalho mais flexíveis. O Brasil se destaca na adoção do modelo híbrido, com 86% dos entrevistados combinando dias de trabalho no escritório e em casa. Esse índice é bem superior à média da América Latina, que é de 72%. Dentro dos modelos híbridos, o mais comum entre as empresas brasileiras é o de dois dias no escritório e três dias remotos por semana, adotado por 45% dos entrevistados.
O futuro do trabalho
À medida que empresas e trabalhadores se adaptam às novas formas de trabalho, o futuro parece caminhar em direção a um modelo mais flexível e personalizado. A escolha entre trabalho presencial, home office ou híbrido não é mais apenas uma questão de preferência pessoal, mas de estratégia empresarial. Cada opção traz suas próprias vantagens e desafios, e o sucesso está em encontrar o equilíbrio certo que atenda às necessidades tanto da organização quanto dos colaboradores. Empresas que conseguirem adotar essas novas configurações de trabalho com eficácia estarão mais bem posicionadas para atrair e reter talentos, estimular a inovação e garantir um ambiente de trabalho saudável e produtivo.
Em contraponto, muitas empresas estão retornando ao modelo presencial, a preocupação com o aumento da produtividade tem sido o principal argumento das empresas ao optar pelo retorno ao trabalho presencial. Um estudo da Universidade de Stanford, publicado em julho de 2023, revelou que o trabalho remoto pode resultar em uma queda de 10% a 20% na produtividade, em comparação com trabalhadores que estão 100% do tempo no escritório.
Não existe uma solução única que funcione para todas as empresas ou colaboradores. O desafio está em identificar qual formato de trabalho traz o melhor equilíbrio entre produtividade, bem-estar e inovação. Enquanto algumas empresas se voltam para o modelo presencial com foco em produtividade, outras apostam na flexibilidade como forma de engajar e reter talentos. O futuro do trabalho será moldado por essa diversidade de abordagens, e o sucesso estará nas mãos das organizações que conseguirem alinhar suas estratégias às necessidades e expectativas de suas equipes.
Não existe uma solução única que funcione para todas as empresas ou colaboradores, pois cada organização possui características e necessidades diferentes. O desafio está em identificar o formato de trabalho que traga o melhor equilíbrio entre produtividade, bem-estar e inovação. Enquanto algumas empresas optam pelo modelo presencial para focar na produtividade e nas interações diretas, outras, investem na flexibilidade para engajar e reter talentos, oferecendo maior autonomia e adaptabilidade. O futuro do trabalho será moldado por essa diversidade de abordagens, e o sucesso dependerá das empresas de alinhar suas estratégias às necessidades de suas equipes, criando um ambiente de trabalho mais dinâmico e adaptado ao momento atual.
Por: Gabriel Cestari